Avançar para o conteúdo principal

Racismo, o horrível racismo

Eu nunca havia presenciado uma situação de racismo. E, embora não me reconheça como negro, meu tom de pele não nega a negritude de meus antepassados, por isso, me indigno com racismo como se o preconceito fosse direcionado a mim. É impressionante chegarmos ao século 21 e alguém ainda achar que o fenótipo das pessoas é lá grandes coisas ou pré-estabelece capacidades. E racismo, além de doer em mim por reconhecer negros entre meus antepassados, dói pelo tamanho da decepção que provoca - fico menos crente na raça humana quando sei de algo do gênero.

Pois hoje, tava eu no BRB, pra pagar umas multas atrasadas. Fui tranquilo, levei um livro porque sabia que ia demorar, e li, li, li... Mais de uma hora depois de chegar, fui atendido. E no momento em que eu era atendido, uma senhora gorda, branca e baixa (em todos os sentidos), se aproximou do caixa ao lado do meu, em que a atendente era negra. Disse algumas palavras inaudíveis pra mim. Não para a atendente. Ao que, no mesmo instante, ela levanta e grita: "a senhora está falando com racismo, comigo!". E cai em prantos, desesperada. Tenta continuar, ainda aos gritos: "não é porque tenho esse cabelo que...", e descamba a chorar mais.

A senhora, no mesmo instante em que a atendente revidou, pôs-se a deixar a agência bancária sem olhar para trás. Todos os que estavam na fila e no atendimento ficaram em choque - eu tremia, boquiaberto e sem saber direito que atitude tomar. Uma mulher da fila do atendimento exclusivo gritou: "cadê a segurança? alguém pode fazer alguma coisa?". Eu, estarrecido ainda, gritei alto para que o segurança da portaria bloqueasse a saída da senhora - "ô segurança, bloqueia essa senhora aí! racismo é CRIME!".

Pouco adiantou. Ele também estava estarrecido.

Uma outra velha da fila (foi mal, mas respeito quem se respeita, e em se tratando de velhos, respeito os que respeitam seus cabelos brancos) ainda tentou dar razão à velha racista, dizendo que o atendimento estava demorando e que ela tinha horário. Outros dois negros da fila começaram uma discussão com ela - "tomara que demore mais, então", e blablablá. Sei que saí na sequência e ainda procurei a mulher do lado de fora da agência, mas ela evaporou. A atendente negra foi amparada por colegas, aos soluços. Uma das colegas, que a retirou do caixa, disse "não liga pra essa gente mal-educada". E eu não me contive e disse alto: "mal educada não, racista!". Mas foi só.

Atravessei a W3 (isso aconteceu na agência Ponta Norte do BRB, na 516 Norte). Cheguei à parada de ônibus, ainda tremendo por fora e por dentro, com vontade de chorar. De raiva, de indignação, de ódio. E de decepção comigo mesmo. Em nenhuma outra situação de injustiça pela qual eu tenha passado, deixei as coisas ficarem muito baratas assim. E dessa vez, não consegui. Devia, eu mesmo, ter detido a senhora e chamado a polícia. Mas não pensei nisso na hora. Foi inédito esse show de absurdo. Fracassei.

E agora, escrevo para desabafar. Escrevo porque tenho medo de esquecer.

Comentários

Enviar um comentário

Mensagens populares deste blogue

O "nosso general" é... Cristo?

O contrabaixo começa um dedilhado e o coração parece compassar igual. Entram guitarra, teclado, bateria de leve. E a voz: "pelo Senhor marchamos sim. O seu exército poderoso é. Sua glória será vista em toda a Terra"... A indiferença dos indiferentes, a essa altura, já se desfez: virou incômodo ou pura emoção. E segue: "vamos cantar o canto da vitória: GLÓRIA A DEUS!" - esse "Glória a Deus!" solto feito um grito de guerra. E a melodia descamba pra algo que enche o peito, e você se sente verdadeiramente parte de uma comunidade. Parece ligado à mesma frequência dos demais, os que dividem o salão contigo. "Vencemos a batalha! Toda arma contra nós perecerá!" (num arranjo vocal, o que faz a segunda voz solta um "pereceráááá", num estilo meio hard rock, parece chegar ao âmago do ser). "O nosso general é Cristo! Seguimos os seus passos! Nenhum inimigo nos resistirá!", entoa forte o refrão. E a essa altura, não há no salão quem não est...

Pago seu IPVA. Pergunte-me como.

Basta que comprove, junto ao Detran, que mora na minha casa! Daí, ano que vem, pago seu imposto sem comunicá-lo e tudo de uma vez! E quando digo tudo de uma vez, digo cota única, licenciamento anual e seguro obrigatório. Tô ficando louco, você deve estar pensando... Eu também acho, ou melhor, ACHAVA que jamais faria uma merda coisa dessas. Achava, do verbo não-acho-mais. Porque fiz. Salário na conta, quinta passada resolvo ir a um caixa eletrônico do Banco do Brasil perto da minha casa - estava de molho a semana toda por conta de uma conjuntivite - e pego aquele carnê de IPVA, que confortavelmente chegou à minha caixa de correio, comprovando que sou dono de um Pálio Fire Flex 2008. Ok, sou mesmo. Dica: não olhe só este dado num documento. Nunca. Preste atenção nas minúcias. Claro que a improbabilidade disso acontecer com você é gigante, mas comigo aconteceu. Fato é que aquele documento não era do MEU carro, e sim, da antiga dona do meu apartamento. E como ela tem leasing, o carnê ...

Livros putos

[leia ouvindo: Mensagem de Amor , do Paralamas] Tenho lido muita putaria ultimamente, sabe? Fui fazer um balanço de minha vida leitora, e cheguei à conclusão que o tema tem sido recorrente entre as minhas preferências literárias. Ok, não é à toa. Busco inspiração para escrever um livro, porque se eu for escrever alguma coisa que preste, tem que ser sobre putaria. E resolvi listar pra vocês algumas indicações dos meus livros putos. Ah, você sabia que puto/putão, no Rio Grande do Sul, é gay enrustido? Aprendi com a Roniara . Puto, no sul de Minas - você sabia que eu morei seis anos em Alfenas , terra do Rogério Flausino e do Wagner Tiso , verdadeira metrópole? - significa dinheiro. "Tô sem um puto no bolso" é o mesmo que estar completamente sem dinheiro, ou "liso", aqui no DF. Ok, esse parágrafo não tem nada a ver com meus livros putos, só abri esse aposto porque adoro fazer essas comparações de palavras conforme as regiões do país. Ou países, já que o Rio Grand...